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Um olhar para o próximo, sem ser um panfletário literário. Digo, longe de ser desses escritores que escrevem demagogicamente. Marcelino é contundente. E verdadeiro. Dono de uma literatura contraindicada para quem vive de olhos fechados para o mundo à sua volta. Com este Amar é crime não poderia ser diferente. Publicado originalmente em 2011, pelo coletivo artístico Edith, é um livro que racistas, umbiguistas, coxinhas, paneleiros e sagradas famílias tradicionais vão amar odiar.

Logo no início, Um poeminha de amor concreto" sem igual. Um manifesto lírico a favor das diferenças, quando o autor corajosa e amorosamente nos dá a notícia de um crime. E se põe junto e na defesa das vítimas de homofobia em nosso país. Na obra de Marcelino ninguém está à margem. Está no centro. O discurso (sem ser discurso) é direto. Desde o flagrante de uma garota de programa, que sempre viveu com pouca roupa, a realizar um simples sonho de infância em "Vestido longo" até a epifânica descrição do passeio de dois homens (namorados?) que empurram um carrinho de bebé. 

Nota-se, nesse conto intitulado "União civil", um maior fôlego nunca visto na carreira do autor, inspirador para o que viria: a "prosa-longa" do solitário e solidário primeiro romance, Nossos ossos. Não há dúvida de que este livro Amar, agora relançado pela Editora Record, é onde encontramos narrativas mais extensas, como se o "criador-vingador" (assim ele se autodenomina) desejasse tornar mais amplos os gritos e dilemas de seus personagens. 

A exemplo do escritor blasé que é confundido com um pastor evangélico no conto "Irmãos". Ou da professora balzaquiana, no verídico "Declaração", apaixonada pela aluna "lolita". E, até, no mais recente "Ricas secas", novidade desta presente edição (ao lado de outros quatro contos pela primeira vez reunidos no volume) e originalmente publicado pelo Selo LOID, do Livre Opinião (www.livreopiniao.com), site de cultura de que sou um dos fundadores e editores. 

Neste "pequeno romance", que faz referência clara ao clássico Vidas secas, de Graciliano Ramos, Marcelino, a partir da tal "crise hídrica" paulistana, disseca hipocrisias e mostra o quanto atuais são a desigualdade social e o mau-caratismo de nossa elite política. Por tudo isso, e por outras verdades presentes nesta obra, a literatura de Marcelino Freire, de fato, não é para quem gosta de histórias fríigidas, "crepusculares" e de finais açucarados.

Como bem diz Xico Sá, na apresentação do Contos negreiros, a prosa deste queridão pernambucano é prosa-rapadura, aquela que "é doce mas não é mole não". Uma voz fundamental para a nossa literatura contemporânea. Amada por mim, agora e eternamente. Vão, por acaso, me prender por isto?


§ Título: Amar é Crime

§ ISBN: 9788501105196

§ Gênero: 1. Contos

§ Idioma: Português

§ Páginas: 166

§ Ano: 2015 (2º Edição)

§ Editora: Record

§ Lugar: Rio de Janeiro

§ Sobre o autor: MARCELINO FREIRE é escritor. Nasceu em 1967, em Sertânia, Pernambuco. Viveu no Recife e desde 1991 reside em São Paulo. É autor, entre outros, dos livros “Angu de Sangue” (Ateliê Editorial) e “Contos Negreiros” (Editora Record – Prêmio Jabuti 2006). Em 2004, idealizou e organizou a antologia de microcontos “Os Cem Menores Contos Brasileiros do Século” (Ateliê). Alguns de seus contos foram adaptados para teatro.

Participou de várias antologias no Brasil e no exterior. “Contos Negreiros” foi publicado em 2013 na Argentina, pela Editora Santiago Arcos e com tradução de Lucía Tennina, e no México, pela Librosampleados, com tradução de Armando Escobar. Criou a Balada Literária, evento que acontece em São Paulo desde 2006, com edições em Teresina (desde 2017) e Salvador (desde 2015). 

No final de 2013, publicou seu primeiro romance, intitulado “Nossos Ossos” (Record – Vencedor do Prêmio Machado de Assis), publicado também na Argentina, pela editora Adriana Hidalgo, na França pela editora Anacaona, e em Portugal pela editora Nova Dheli. Em 2018, lançou pela José Olympio o livro “Bagageiro”, que reúne o que ele chama de “ensaios de ficção”. Coordena oficinas de criação literária desde o ano de 2003.